O decreto que flexibiliza as regras para o porte de armas no Brasil sofreu
nesta quarta-feira (12) uma derrota no Senado.
Por 15 votos a 9, senadores rejeitaram o
parecer do senador Marcos do Val (Cidadania-ES) na CCJ (comissão de Constituição e Justiça). O
relatório de do Val era contra os projetos de decretos legislativos apresentados pelos senadores
Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Humberto Costa (PT-PE), Eliziane Gama (Cidadania-MA) e Fabiano
Contarato (Rede-ES) para sustar os efeitos do decreto do presidente Jair Bolsonaro (PSL).
Apenas PSL e DEM orientaram que seus senadores votassem a favor do decreto das armas.
O
relator ainda pode recorrer ao plenário do Senado, onde o mérito do decreto será apreciado de fato.
Na comissão, ainda há quatro votos em separado. Se o primeiro deles for aprovado, os demais não
precisam ser votados.
Três deles são contra o decreto e foram apresentados pelos
senadores Veneziano Vital do Rêgo (PSB-PB), Rogério Carvalho (PT-SE) Fabiano Contarato (Rede-ES). O
senador Marcos Rogério (DEM-RO), por sua vez, apresentou um voto em separado a favor do decreto de
Bolsonaro.
Antes da votação, Marcos do Val fez um apelo aos seus colegas e disse que sua
irmã, que, segundo ele, foi alvo de ameaça, estava fazendo o teste necessário para ter porte de
arma.
O relator alegou que armas sozinhas não matam ninguém e que a questão não é a
quantidade de armas, mas em que mãos elas estão.
O cidadão que segue a lei, o
caminhoneiro, o morador do campo, toda gente honesta e sofrida precisa de, no mínimo, segurança para
viver e trabalhar, afirmou.
Antes mesmo da votação, o líder do PSL no Senado, Major
Olímpio (SP), já previa a derrota.
Vai cair o decreto e vai ser festa na quebrada, festa
das facções. Só vai piorar para o cidadão. Derruba o decreto! Parabéns, senhores senadores. Quem
está ganhando com isso é o mundo do crime, bradou ao microfone.
Olímpio também
relativizou a perspectiva de derrota para Bolsonaro, que prometeu em campanha a liberar o porte e a
posse de armas no Brasil.
O compromisso dele era de apresentar com verdade o decreto à
sociedade. Quem não está cumprindo com o compromisso somos nós, disse o líder do PSL.
O
senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República, disse que, pelo discurso da
oposição, parece que estamos vivendo num paraíso de segurança pública e afirmou que o direito à
vida é inegociável.
Armar a população com este decreto significa dizer que, onde o
estado não vai, vamos dar arma à população para matar e se proteger, disse o senador Renan
Calheiros (MDB-AL).
O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que derrotar o decreto vai
ser uma forma de dizer vamos devagar aí com este andor.
Este não é o primeiro parecer
feito por do Val a favor do decreto. Como o governo promoveu alterações, o senador teve que redigir
um novo parecer.
O senador também relata parte do projeto anticrime, similar ao do
ministro Sergio Moro (Justiça), que tramita na CCJ da Casa.
Bolsonaro teve que promover
alterações na primeira versão do decreto por pressão do Legislativo e do Judiciário.
A
versão atual da medida proíbe que cidadãos comuns portem armas de fogo como fuzis, espingardas e
carabinas, permissão que havia sido criticada por especialistas em segurança pública.
A
iniciativa também estabelece em 14 anos a idade mínima permitida, com autorização dos pais, para a
prática de tiro esportivo. O decreto anterior concedia a autorização para menores de 18 anos, mas
não definia idade mínima.
Técnicos do Senado emitiram uma nota técnica na semana passada
em que afirmam que a nova versão do decreto mantém as inconstitucionalidades encontradas no texto
original.
O relator afirmava nas 18 páginas de seu parecer que a maioria do povo
brasileiro é a favor da liberdade para se adquirir armas, mesmo que muitos cidadãos não queiram,
necessariamente, possuí-las em casa.
Para embasar seu argumento, citava o referendo
realizado em 2005 em que 63% dos brasileiros votaram a favor do comércio de armas. Ele cita também
uma pesquisa feita no site do Senado em que 96,4% dos internautas que se manifestaram foram contra
os projetos para sustar o decreto de Bolsonaro.
Da mesma forma, não custa lembrar que a
nova regulamentação da posse e do porte de arma de fogo sempre foi uma das bandeiras políticas do
presidente da República, Jair Bolsonaro, eleito com quase 60 milhões de votos, afirmava o
relator.
Na parte mais técnica de seu parecer, Marcos do Val rebatia a crítica da
abrangência do decreto, que amplia a quantidade de categorias que podem ter acesso a armas, alegando
que a efetiva necessidade é apenas um dos requisitos exigidos para que o porte de arma seja
conferido.
O relator dizia ainda que o decreto estabelece os precisos conceitos
necessários à aplicação do Estatuto do Desarmamento e se colocava favorável ao porte de armas para
moradores de área rural e para caminhoneiros.
Ele também se manifestava a favor do porte
para indivíduos sujeitos a represálias, citando agentes de segurança pública inativos e
conselheiros tutelares e advogados.
Marcos do Val argumentava também que as alterações legais
promovidas pelo decreto são voltadas ao cidadão que quer defender a si próprio e à sua família.
Três votos em separado apresentados têm conclusão oposta.
Os dispositivos são
materialmente inconstitucionais por regulamentar norma editada pelo Parlamento em sentido
precisamente oposto àquele significado que o legislador emprestou originariamente à lei, diz
Veneziano em seu relatório.
Ademais, são também formalmente inconstitucionais, porque
estipulados pelo Poder Executivo, ente destituído de competência para inovar a legislação brasileira
quanto à matéria, com clara extrapolação de sua competência normativa, que é sujeita e subordinada à
lei, diz o texto.
Rogério Carvalho encerra seu voto em separado afirmando que não há
outra conclusão senão a que é pela inconstitucionalidade e nocividade do decreto presidencial, que
vulnera a segurança da população brasileira e, ainda, atenta contra a Constituição e as
prerrogativas constitucionais do Congresso Nacional.
Mas o voto de Marcos Rogério se
posicionou a favor do decreto de Bolsonaro, contra os decretos legislativos. Ele alega que a CCJ não
é o local apropriado para a discussão do mérito da medida.
Eu mesmo tenho algumas
ressalvas pontuais quanto aos decretos executivos ora discutidos. Sou favorável aos decretos, mas
tenho preocupações especialmente quanto a armas de maior potencial lesivo.
Mas essa é uma
questão de mérito, e está dentro do poder discricionário do chefe do Poder Executivo, afirma o
senador do DEM.
Assim, se os opositores do decreto desejam discutir qual arma deve ser
ou não de uso permitido, quantas munições, idade, efetiva necessidade etc., devem fazer pela via
constitucionalmente adequada, a saber, a lei.