A Fifa passará por novas eleições presidenciais depois de Joseph Blatter
decidir deixar o cargo entre dezembro deste ano e março de 2016. Mas os vícios da entidade vão além
do nome de seu comandante. A própria reeleição do suíço, cinco dias atrás, ilustra como os problemas
são mais profundos. Ela reproduz um modelo mundial, em diversos níveis, de perpetuação dos
dirigentes do mundo da bola no poder - e que permitiu que a entidade máxima do futebol tivesse, nos
últimos 41 anos, somente dois presidentes.
Além do suíço, que assumiu em 1998, o brasileiro
João Havelange foi o único a estar à frente da entidade nas últimas quatro décadas. A lógica é
simples: sob uma cortina de democracia, as afiliadas de menor poder aquisitivo (e que, obviamente,
têm maior dependência de programas de suporte financeiro das entidades) possuem voto de mesmo peso
das mais poderosas - que ficam em menor número quando se trata de assembleia geral para eleição de
presidentes. Da Federação de Futebol do Rio (Ferj) à Fifa, esse pilar central do sistema é mantido,
bem como os dirigentes nas principais cadeiras das entidades do futebol.
Nos dias 28 e 29 de
maio, a Fifa reelegeu Blatter para continuar à frente de suas decisões. Um quinto mandato, 20 anos
de poder. Nada de muito novo no mundo da bola, não fossem as prisões de sete dirigentes ligados à
entidade que deflagraram um esquema de corrupção e propinas espalhado em diversos níveis da
estrutura de organização do esporte mais popular do planeta. O suíço não foi diretamente atingido,
mas gente de seu alto escalão, como o vice-presidente Jeffrey Webb, foi.
E, mesmo assim,
Blatter contou com o apoio incondicional de 133 das 209 afiliadas com poder de voto. A sua
confederação continental mais poderosa, a Uefa, que reúne os países europeus, se rebelou. E não
adiantou. Foi engolida por votos de afiliadas de pouca tradição, que recebem ajuda da Fifa e, dessa
forma, temem qualquer tipo de mudança.
Durante o Congresso da Fifa, a reportagem
conversou informalmente com diversos cartolas dessas federações de menor poder aquisitivo. Um dos
poucos a falar abertamente sobre a relação com a entidade foi um cartola da Federação Cubana, que
confirmou o apoio a Blatter um dia antes das prisões efetuadas em Zurique, alegando justamente que a
entidade colaborava financeiramente para o desenvolvimento do esporte no país.
O único rival
de Blatter na eleição, o príncipe da Jordânia Ali bin Al-Hussein, obteve 73 votos, o que significa
que, além da Uefa, que votou em bloco contra o suíço, somente cerca de 10% do total de afiliadas da
Fifa se posicionou de forma contrária à administração, mesmo com todos os escândalos que pipocam na
mídia internacional. Ele pretende ser novamente candidato.
O sistema se repete mesmo em nível
local. No Rio de Janeiro, por exemplo, a federação estadual, Ferj, usa a mesma lógica em seus
estatutos. Embora clubes da Série A do campeonato que organiza tenham um peso maior na assembléia
geral da entidade, seus votos são invariavelmente engolidos pela escolha de clubes de baixíssimo
poder aquisitivo, amadores e até ligas independentes de futebol no estado.